terça-feira, 19 de abril de 2011

meus dedinhos, onde estão?

 Todos, quando crianças, já brincamos de interagir com os corpos ao nosso redor. Não o fazemos por pura hiperatividade, mas sim porque o tato é o único sentido existencialmente completo em si. Pois, a visão, por mais que capture, não expõe. A fala, por mais que possa enlaçar os outros e a nós mesmos, pela audição, não garante a compreensão e a mutualidade alheia (vide aqueles pobres cuja solidão já se tornou tamanha que a fala consigo mesmo se mostra necessária, mas que não garante sua melhora). A audição às vezes pode ser pior que a fala, pois não só deixa de garantir a comunicação (muitos de nós não compreenderíamos um "bosquímano australiano") como também não pode promover sons por si própria. O paladar, enfim, gostos não são exatamente existenciais, pois são tão concretos como aquilo que um esquizofrênico vê ou ouve. Talvez, o que mais vislumbra à existência no paladar é o gosto do próprio sangue. Mas não posso considerar tal característica como fomentadora da sensação de existência pois, como já falei, não se pode confiar naquilo que não se vê, não se ouve, se toca (talvez se cheire) - o gosto. Já o tato, não. Esse não só transmite a sensação do outro, mas como nos transmite ao outro. Vocês podem argumentar - "e as neuropatias periféricas?" pois bem, essas, em geral, caríssimos, não promovem a perda do tato, mas sim sua diminuição (ou potencialização). Ainda assim, o que posso considerar como "vontade máxima para a sensação existencial", que é segurar, abraçar, tocar alguém, só se é possível com a intenção de quem o faz. Ademais, mesmo que não se sinta o toque, há de se perceber seguro (imagino que não há patologias que impeçam de notar que algo te segura!).


E, não pensem que um crise existencial no caráter de "sentir o mundo", "se sentir no mundo", é algo irrisório, ou digno de escárnio, pois, ignóbeis são aqueles que ainda não perceberam a grandeza da existência.

terça-feira, 12 de abril de 2011

é um instrumento de literatura ou de retórica que consiste em dizer o contrário daquilo que se pensa, deixando entender uma distância intencional ...

 Justamente quando eu adiciono o fatídico Cinema Cultura no blog roll desta espelunca, percebo que este está fora do ar. Desde quando? Não sei, provavelmente foi algo de hoje, ainda, já que ontem eu baixei Film d'amore e d'anarchia.


Sinceramente, a internet sofreu um atentado nesse mês. Não obstante o Vagalume Rosa, do Wordpress, agora o Cinema Cultura, que era do Blogger, que mostra uma faceta homofóbica e retrógrada do Google. Qual será o próximo passo pra zerar a cultura no espaço virtual de vez? Acabar com o Tomando no Koo? Diminuir a minha blogrolla? De fato, castrar as fontes deste mísero blogayro?


Enfim, este é o atual cenário da internet brasileira. Extinção de blogs relevantes, perseguição de blogs LGBTT's, pornográficos ou não, restrição de meios e da liberdade de expressão... aquela "internet anárquica" que idealizávamos nunca existiu, e pelo jeito que se toca a carruagem, nunca existirá.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Análise Pelicográfica #7 - "Salò o le 120 giornate di Sodoma" (1975)


Título traduzido: Saló ou Os 120 dias de Sodoma
Direção: Pier Paolo Pasolini
Gênero: Drama, Comédia, Explotation

Origem: EUA
Diálogo: Italiano (majoritariamente) , Francês e Alemão
Duração: 1 hora e 51 minutos segundo a Wikipédia
Cor: Colorido
Link: Com esta postagem eu brindo a inclusão do Cinema Cultura na blogrolla (ou da blogrolla no Cinema Cultura, depende do ponto de vista). Sentimo-nos lisonjeados, palmas!, palmas!.



Spoilers! Esta é, inegavelmente, uma magnum opus. Não consegui definir se Pasolini quis, com tamanho explotation, destilar o "espírito" do nazifascismo, que se assenta na bestialização do homem, ou se ele o retrata "ao avesso".        


 Na primeira assertação, é singela a premissa: a partir a desumanização das pessoas com tantos abusos, assassinatos, torturas e horrores amiúde, os próprios nazifascistas se bestializavam. A coprofagia, o gosto pela tortura, a necessidade de subjulgar as normas sociais e a sodomia* são todos vistos nas bestas. Assim, quando Pasolini representa toda a anarquia** gerada pelos personagens poderosos, ele não tem a mesma intenção de John Waters, outro grande nome do Explotation. Enquanto o ideal maior de Waters é chocar a hipócrita, moralista - e com os primeiros traços do que hoje seria a voga do "politicamente correto" - sociedade estadunidense, Pasolini busca apropriar-se dos exageros como ícones à real alta sociedade nazifascista.
*Quando me refiro a sodomia, quero dizer do estupro não-copulativo. Ou seja, de estupros que não tenham a intenção de gerar crias, tal qual no mundo animal, onde diversas vezes um ser aproveita do outro para satisfazer seus hormônios, quando não podendo consumir a cópula efetiva.
**Citando um excelente diálogo aos 38:13 minutos: "Observando, com igual paixão e apatia, Guido e Vaccari masturbando os dois corpos que nos pertencem, inspira um número interessante de reflexões. [O Magistrado então pede: "Importaria-se de se explicar melhor, caro Duque?", que então retoma] Nós fascistas, somos os verdadeiros anarquistas. Naturalmente, uma vez que nos tornamos mestres do estado, a verdadeira anarquia vem do poder.". Logo, a extensão do poder gerada pelo acordo das quatro personagens poderosas ilimita suas vontades. A anarquia é, evidentemente, usada no sentido de "superioridade ou não-respeito às leis cívicas e normas sociais".


 Com a segunda hipótese, a qual Pasolini faria um "retrato avesso" do nazifascismo. Pois vejamos bem: um dos principais fundamentos do nazifascismo é o respeito e sublevação do sujeito ao Estado e/ou a sociedade. Gerando uma mescla de ambos, tal qual em regimes teocráticos onde a maioria da população é adepta da religião oficial, as normas sociais, ou seja, a distinção entre aquilo que é aceito ou excluído pela sociedade, é normativizado legislativamente. Tal qual a sociedade alemã machista e homofóbica da República de Weimar rejeitava, a política nazista do Terceiro Reich condenaria homossexuais aos campos de concentração. Mas, enquanto primava pela saúde daquilo que considerava humano, o nazismo se intoxicava com a degradação de todo o restante. A vocês, não parece contradição? Eles se apoiavam num conjunto de leis morais e numa pseudo-ciência (o darwinismo social tinha diversas falhas que o condenavam desde o nascimento) hipócrita e completamente bestial, que simplesmente anulava tudo aquilo que não convinha. Assim, enquanto eles pregavam o que era humano ou não, seus atos de selvageria há muito comprovavam sua desumanidade. E Pasolini mostra isso expondo um "negativo" da moral fascista e conservadorista no norte da Itália durante a ditadura de Mussolini.


Enfim galeras, apesar de forte e blablabla, é um filme recomendadíssimo. Mesmo com toda sua carga, intimidador e visceral, Saló consegue ser um filme bonito. A quem convém assim ver, é claro. Não postei imagens nem me prolonguei na análise pelo sono e pelo despertar às 6am amanhã. Então, besitos besitos, tchau tchau!